Se me contassem eu não iria acreditar, mas aconteceu comigo: ontem, aos 33 anos de idade, descobri que passei a vida escrevendo meu nome errado. Desde criança escrevo meu primeiro nome como Aurélio. Porém, meu nome oficial na certidão de nascimento é Aurelio, sem acento. E o bizarro é que eu nunca percebi essa diferença!
Estou chocado. Logo eu que gosto tanto de padrões e manipulação de texto, que estou sempre atento aos detalhes. Como pude deixar passar essa? E durante tantos anos? Bizarro, é só isso que consigo pensar.
Posso até dizer que me bateu uma crise de identidade. Imagina, quantos cadastros já preenchi, as provas da escola, os meus livros, até minha assinatura é acentuada! Ontem eu era o Aurélio, agora eu sou um erro ortográfico, que até o fim da vida vai ser sublinhado com riscos vermelhos.
Tá, chega de drama, é só um acento :)
Vamos logo passar pra comédia história: tudo começou no dia do casamento. Horas depois de voltarmos do cartório, já em casa, a Mog pegou a certidão de casamento para ler.
─ Teu nome tá sem acento.
─ Sério? Deixa ver… É mesmo!
─ Aurélio… Você tem certeza que teu nome tem acento?
─ Claro né! Dããããr, que pergunta.
─ Eu acho que o teu nome não tem acento.
─ Ah Mog, vai catá coquinho vai, até parece.
Minha certeza era tão inabalável que somente cogitar essa possibilidade já parecia um absurdo. Imagina só se eu não saberia meu próprio nome…
Mas tá, isso foi há duas semanas. Ontem estava eu aqui, sozinho em casa, e precisei fazer uma compra em um site. Na tela de cadastro, após eu preencher todos os meus dados pessoais, li uma mensagem que dizia para conferir se os dados eram os mesmos que constavam no cartão de crédito. Olhei para o cartão e conferi os números e a data. Vi ali também o meu nome impresso: AURELIO M JARGAS, sem acento.
Nessa hora deu um clique e lembrei da pergunta absurda da Mog:
─ Você tem certeza que teu nome tem acento?
Pela primeira vez, titubeei. Será que… Não, impossível, imagina que ridículo… Mmmm… Será? Pulei da cadeira, abri o armário e peguei a pasta que guarda meus documentos. Um por um, fui conferindo. Carteira de reservista do exército, título de eleitor, carteira de motorista, CPF, RG, todos sem acento. Mas até aí nenhuma novidade, as poucas vezes que olhei estes documentos e percebi que não tinha acento, a explicação que veio na minha cabeça era sempre a mesma:
Essas porcarias desses sistemas toscos MS-DOS que o governo usa, além de só escrever em maiúsculas, não usam acentos.
Mas meu mundo desabou quando encontrei a prova cabal: uma cópia de minha certidão de nascimento. Eu já vi esse documento várias vezes, mas dessa vez eu estava realmente prestando atenção. E contrariando todas as minhas certezas, lá estava, datilografado em maiúsculas, para o mundo ver: AURELIO MARINHO JARGAS, sem acento.
Olhei mais de perto. Vai que o risquinho do acento saiu meio falhado? Máquina de escrever, sabe como é. Que nada, não havia risquinho. Era só uma letra E mesmo. Então, neste momento, em silêncio, segurando a certidão perto do rosto, meu queixo caiu. Figurativamente, ok? :)
Chocado, liguei pra minha mãe.
─ Mãe! Tenho uma notícia bombástica pra te contar!
─ Ai, ai, ai. O que é?
─ Descobri que meu nome não tem acento!
─ Hein?
─ Meu nome, é Aurélio sem acento!
─ Sim, eu sei filho, respondeu ela, calmamente.
[queixo caindo ainda mais]
─ Como assim??!? Desde criança, eu sempre escrevi Aurélio com acento!!!!
─ Sério? Nunca percebi.
─ Coooomo não mãe!!! Tudo! Na escola, nas provas, minha assinatura. Olha aí, olha na capa dos meus livros!*
─ Noooossa, é mesmo filho…
E assim, neste dia também descobri que a falta de atenção ao meu nome é hereditária ;)
* A mãe deixa os meus livros na mesinha da sala, sempre à mostra. Sabe como é, pra mostrar pras visitas :)