Esse post começou há quatro horas atrás com o inocente título “Vendida a apostila número 200” e descambou para uma crise existencial editorial sem conclusão aparente :)
Sou escritor, autor de duas obras na área de informática: um livro sobre Expressões Regulares e uma apostila sobre Shell Script. O livro foi publicado por uma editora e está à venda nas livrarias enquanto a apostila é um arquivo digital (e-book) que eu vendo por e-mail.
O tradicional e o moderno. O corporativo e o artesanal. Duas experiências completamente diferentes.
Como estou me preparando para a escrita de um livro novo sobre Shell Script, fiquei na dúvida se lanço como livro ou e-book. Então resolvi fazer uma análise comparativa das experiências que tive até aqui e gostaria de compartilhá-la.
O processo criativo é exatamente o mesmo em ambas abordagens: ter a idéia, sentar e escrever o texto no computador. É você e o editor de textos em uma parceria que pode durar semanas, meses, quem sabe anos. Não é nada sexy passar os dias enclausurado na frente do monitor, mas é o jeito… Não é difícil fazer um livro. Se você tem uma idéia e gosta de escrever, comece já!
A diagramação também não muda. Seja para o livro impresso ou para o e-book, você terá que dividir os assuntos em tópicos, alinhar tabelas e figuras, definir margens, quebras de página e tipos de letra. Dependendo da editora, o autor pode escrever o texto sem se preocupar com o formato e deixar a diagramação com eles. Para romances e livros sem necessidade de estruturação, funciona. Mas para livros técnicos cheios de tabelas, listagens, códigos e figuras, é importante já conferir o resultado formatado enquanto se escreve. Uso o txt2tags para escrever e formatar o texto com um mínimo de esforço, conferindo o resultado no navegador. Se por um lado a editora pode ter regras rígidas de diagramação, em um e-book você é livre para apresentar o conteúdo a seu gosto.
A publicação é o primeiro ponto de grandes diferenças. Se for pela editora, seu trabalho com a obra já acabou. Basta enviar o conteúdo e deixar que eles revisem, finalizem, imprimam milhares de cópias e distribuam pelas livrarias do país. Já no e-book você mesmo faz a revisão final e salva o arquivo no formato PDF. Está pronto para a venda.
O marketing é por sua conta e bolso se lançar um e-book. Dependendo de sua rede de contatos e da popularidade de seu blog, com custo zero é possível atingir um grande público. Mas será aquela propaganda de boca a boca, por indicação, que pode demorar para surtir resultados. A editora tem recursos para campanhas mais agressivas em sites, folders, revistas, televisão, tarde de autógrafos, coquetéis de lançamento e uma infinidade de outras técnicas de retorno imediato.
A visibilidade de um e-book está restrita ao alcance do autor e seus recursos. Um site, uma newsletter, comentários e resenhas de leitores, resultados no Google. Já pela editora, além de todos estes recursos, seu livro estará espalhado pelo Brasil, presente na maioria das livrarias, inclusive aquela pertinho de sua casa. Chegar naquela megastore do shopping e perguntar a opinião do vendedor sobre o seu próprio livro ou ver a alegria de sua mãe ao ler o nome do filho na capa de um livro são prazeres que o e-book não pode proporcionar.
A credibilidade de um livro impresso é indiscutível. Uma editora apostou em você, sua obra está nas livrarias, seu nome está nas ruas. Ter um livro em seu currículo é algo que ainda impressiona muito os empregadores. Um e-book soa amador, mambembe. É como se o autor não tivesse conseguido publicar a obra via editora então resolveu lançar como e-book. Tem muita diferença dizer “tenho um livro na livraria” e “tenho um PDF na Internet”.
Os rendimentos variam muito. Nesse ponto o e-book ganha disparado em valor, mas perde em quantidade. Pela editora, o autor recebe 8% do valor de tabela do livro. Você leu direito: oito. No meu caso que o livro custa 20 reais, recebo R$ 1,60 por cada exemplar vendido. Diz a lenda que se o escritor for famoso, pode receber 10%. Acima disso somente Paulo Coelho e nomes tão-pop-quanto. A porcentagem é baixa, mas justificada. Meu editor é um profissional transparente que fez questão de me mostrar todas as notas fiscais e explicar para onde vai cada pedaço do bolo. Como os custos de produção e publicação de um livro são altos, quem fica com o maior pedaço são as livrarias. Mesmo com uma porcentagem tão baixa para o autor, devido ao alcance nacional das livrarias, o livro vende bem, então ganha-se na quantidade. Com o e-book seu lucro é de praticamente 100%, pois os custos de divulgação e envio são mínimos. Assim, um e-book vale por vários livros (12,5 em meu caso).
O dinheiro na conta vem em lotes para um livro publicado. Eu recebo a cada três meses, juntamente com um relatório das vendas naquele período. Basta esperar, não preciso fazer nada. Com o e-book é mais complicado, cada venda é um processo que pode levar dias. Começa com uma troca de e-mails para passar o número da conta no banco, espera o interessado fazer o pagamento, confere se caiu na conta então envia o e-book para seu e-mail. Como ainda uso acesso discado à Internet, esse envio é particularmente demorado. Muitos desistem no meio do caminho (35%), não fazendo o pagamento. Os motivos são vários, principalmente pelo processo demorado, o interessado acaba mudando de idéia. Comprar um livro na livraria é imediato, mais passional. Mas uma vantagem do e-book é a flexibilidade no pagamento. Em meu caso, aceito depósito, transferência, DOC, vale postal, PayPal e o mais peculiar de todos: o escambo. Além de poder presentear os amigos sem custo extra.
O contato com o leitor é bem superficial no caso do livro impresso. Eu sei apenas que no mês foram vendidas N cópias, sem a menor idéia de quem comprou. Alguns entram em contato via e-mail e outros assinam o livro de visitas, mas a grande maioria permanece no anonimato. Criei uma galeria de fotos dos leitores para incentivar o leitor a “mostrar a cara”, aparecer. Ajudou um pouco. No e-book a venda é iniciada trocando-se e-mails, então tenho os dados básicos (nome, e-mail, cidade) de todos os compradores. De posse desses dados posso traçar perfis de consumo. O perfil padrão dos compradores de meu e-book é: homem (97%), paulista (34%) e paga com DOC (39%). Interessante não? Também posso enviar formulários de opinião e avisar sobre possíveis descontos, errata ou obras futuras.
Para o leitor os prós e contras de cada formato são claros. O livro impresso é prático, rápido de folhear, pode ser lido em qualquer lugar, ótimo para ficar por perto, ao alcance da mão. Mas não tem busca, sua produção consome recursos naturais (energia, papel, tinta) e se for grande, pesa. Já o e-book requer um computador ou equipamento que leia arquivos no formato PDF, cansa a vista e consume energia. Mas conta com as vantagens de poder fazer buscas no texto, copiar e colar trechos e ser lido por cegos (com sintetizador de voz).
Os números das minhas obras, com contabilidade relativa a Fevereiro de 2006:
Livro (impresso) |
Apostila (e-book) |
|
---|---|---|
Data de lançamento | Jul-2001 | Fev-2004 |
Tempo de mercado | 55 meses | 24 meses |
Páginas | 96 | 114 |
Preço | R$ 20,00 | R$ 20,00 |
Porcentagem do autor | 8% | 100% |
Unidades vendidas | 2.352 | 201 |
Rendimentos | R$ 3.763,50 | R$ 3.551,00 |
Ritmo atual de vendas | 40 unid./mês | 5 unid./mês |
Rendimento atual mensal | R$ 64,00 | R$ 100,00 |
A conclusão é que ainda não tenho conclusão :) Se por um lado o e-book artesanal rende mais vendendo menos, por outro lado o livro impresso traz benefícios não contábeis além de manutenção zero.
Gostaria de ouvir (ler, no caso) a sua opinião. Se você também é autor, conte sua experiência. Se você é leitor, qual a sua preferência na hora de comprar o livro? Deixe seu comentário.