Sabadão, sete da tarde. Ainda tinha cerca de uma hora antes de escurecer. Intimei o Nissin para subirmos o Morro do Boi (aquele da Praia Mansa). O cronograma estava apertado, mas dava tempo de ir, subir e descer antes do sol desaparecer. No caminho para o morro, encontramos o Lício e o Zóio. Agora a equipe de escalada tinha quatro integrantes. Nossos equipamentos estavam em dia: bermuda e pés descalços. Chegamos e subimos. Tranqüilo. A vista do pico é sempre um colírio para os olhos, ainda mais no pôr-do-sol. Na descida, a primeira idéia brilhante surgiu: vamos na praínha! É uma trilha alternativa, que desce para o outro lado do morro, terminando numa minipraia encravada no costão. É claro que era uma péssima idéia, visto que já tinha começado a escurecer, mas quatro cabeças pensam pior do que uma :) Quando chegamos na praínha, já estava aquela luz difusa (lusco-fusco) e dali 10 a 15 minutos estaria um breu. O certo seria voltar correndo pela trilha que viemos, mas eis que surge a segunda idéia brilhante do dia: vamos voltar pelas pedras!
Pausa para um contexto explicativo:
A encosta do morro é irregular, íngreme e possui vários filetes de água que deixam a pedra lisa. Em condições normais (sol forte, maré baixa, pedra seca), contornar o morro pelo costão demora cerca de 30 minutos e exige atenção dobrada. Tínhamos no máximo 15 minutos de luz e a maré estava alta, com ondas batendo nas pedras. Escrevendo agora, é difícil acreditar que isso parecia uma boa idéia naquele momento, mas foi justo o que fizemos.
O coletivo irracional decide que as pedras são legais. Começamos a volta e a previsão de pedra escorregadia se confirmou. Seguimos com atenção máxima e velocidade mínima. A cada passo menos se enxergava, até que o último fiapo de sol se foi. Nossa sorte nesse momento é que o céu estava limpo, sem muitas nuvens, então mesmo no escuro era possível enxergar os vultos. Longos minutos se passaram e quando faltavam poucos metros para o final, chegamos no ponto mais perigoso, a última escalada de pedra que tem um trecho onde as ondas estavam batendo forte. Teria que contar o tempo das ondas, esperar e usar a curta janela de tempo entre duas ondas para atravessar uma pedra com limo e escalar um paredão de 90 graus com quase 3 metros. Ah, no escuro. Pela primeira vez no dia, as cabeças pensaram: aquilo era perigoso demais e não ia acabar bem. Sem outra opção, só nos restava voltar todo o caminho que fizemos pelas pedras e pegar a trilha da praínha…
Na volta, apreensão e tensão. Tudo escuro, pedra lisa, sem opções. No meio do caminho de volta, com os olhos meio que já acostumados ao escuro, vimos um buraco na mata, que parecia ser o início de uma trilha. Entre continuar pelo costão ou pela mata fechada, a mata parecia um presente divino de segurança e conforto. Mas lá dentro, sem o céu estrelado para ajudar, era um breu só. Preto sobre preto, impossível de enxergar. A salvação veio com os celulares do Lício e o Zóio. Eles não tinham aquela lanterna, mas somente a luz do visor já ajudava a enxergar vultos na escuridão. E assim voltamos pela mata, com a tímida luz do visor de dois celulares, tropeçando, escorregando, saindo da trilha. Como é fácil se perder no escuro. E finalmente chegamos no final, saímos do morro, aleluia! Como foi bom ver a rua iluminada da Praia Mansa, a calçada, pessoas… Horário: 21h30.
No fim, tudo acabou bem. Para aliviar o estresse, entramos no mar pegar uns jacarés. Molhados, cansados e com fome, um sorrisão no rosto. Conseguimos sair ilesos da situação de perigo que nós mesmos criamos. Uma celebração bizarra da verdadeira amizade: amigo não é aquele que te tira da enrascada, mas aquele que vai junto e te convence que vai ser legal :)